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quarta-feira, 20 de março de 2013


Nos caminhos do Redentor....

 Material: Preparar a sala com um caminho (de pano ou margens de barbante), no qual se podem colocar os símbolos: sandálias, Bíblia, Pão, cruz e vela acesa

1.    INVOCAR O ESPÍRITO SANTO: em um lugar aconchegante, assentar-se de modo confortável e invocar o Espírito Santo para que tenha uma proveitosa Leitura Orante da Bíblia.

 
2.    LER O TEXTO: Lc 24, 13-35. Ler pausadamente, procurando saborear bem cada versículo, até compreender bem o que diz todo o texto

 
3.    MEDITAR O TEXTO: Meditar o texto todo ou algum versículo que mais lhe toca o coração. O que o texto me diz? Essa é pergunta que pode orientar esse momento.

 

·         Durante a quaresma, fizemos uma caminhada com Jesus, buscando consolidar bem cada passo, na acolhida da proposta da Igreja: oração, conversão, penitência e prática de um amor mais concreto. O caminho de Jesus nos levou à descoberta das “tentações” que residem dentro de nós e nos impedem uma caminhada mais fiel ao seu projeto de amor, de misericórdia, de compaixão e de bondade. Fomos convidados a deixar para trás tudo isso, para uma adesão verdadeira, de mente-espírito-postura, à nossa vocação fundamental de discípulos e amigos do Senhor;
·         O Domingo de Ramos: Com o Mestre somos chamados a trilhar o caminho que o leva à Jerusalém, a “cidade que mata os profetas”. O convite a segui-lo nos coloca no caminho da humildade, do serviço sob pena de perder nossas comodidades, da entrega da própria vida. Aos pés do Mestre montado em um jumentinho reconhecemos, mais uma vez, que Ele é o Messias, o nosso Salvador, que se faz tão próximo de nós, a ponto de se esvaziar de todo o poder para nos amar e servir. Ali nos convém despir as vestes da vaidade, da prepotência e do comodismo, para um empenho maior na atenção e solidariedade aos nossos irmãos, especialmente os mais sofredores. Também com Ele revivemos o drama da condenação e morte do Justo, reconhecendo a dureza de nosso coração, tão contraditório e carente de perseverança na justiça, no bem e na coragem de testemunhar o amor;
·         A Quinta-feira Santa: O caminho do Senhor nos leva à sua intimidade. Ao instituir a Eucaristia, nos faz experimentar um amor incondicional e o desejo infinito de Deus de se manter vinculado a nós, homens e mulheres fracos, mas revigorados sempre pelos sinais de sua presença: seu Corpo e Sangue. Se às vezes o caminho é duro demais e nos passa pela mente a ideia de desistir ou recuar, ouvimos do próprio Deus: “levante-te e come, pois tem um longo caminho a percorrer”. De fato, o caminho do Senhor está terminando onde começa o caminho do discípulo missionário. Somos convocados a “fazer a memória” dele, amando, perdoando, promovendo a vida, consolando os aflitos, cuidando de tantos irmãos que esperam dos cristãos eucarísticos os autênticos gestos da ternura, da acolhida e da compaixão. O caminho proposto e vivido pelo Mestre novamente nos propõe o desapego, o despojamento, a generosidade e a caridade que nos  impele a “lavar os pés”, servir sem qualquer restrição àqueles com os quais convivemos ou estão excluídos de nosso circulo de relações afetivas. Assim, teremos entendido o mandamento do amor;
·         A sexta-feira Santa: O caminho do Servo Sofredor passa pela cruz e pela morte. Revela a dramática experiência do viver e o preço do amor oblativo. A Paixão do Cristo, escandalosamente nos aponta o coração traspassado de Deus, que nos ensina, nos rastros de dor do Calvário e aos pés da cruz, a relatividade de tudo aquilo que não seja o seu Reino, a provisoriedade de nossos projetos – por melhores que sejam- e o total despojamento da vida para gerar mais vida. Pelo sacrifício (fazer santo, sagrado) de nossas vidas passa o caminho do Senhor, e com Ele nós caminhamos na certeza de que a derradeira palavra de Deus sobre o destino humano não é a morte e a destruição;
·         Solene Vigília Pascal e Domingo da Ressurreição: Nada é capaz de abafar a voz amorosa de Deus! Ainda que as sombras da morte e do aniquilamento tenham rondado até  o próprio Deus – muito mais estão em nosso caminho!- a Luz que brota do túmulo vazio e as palavras do Anjo: “Ele não está mais aqui. Ressuscitou!”, nos motivam a percorrer apressadamente um caminho de vida e alegria que nos conduz a um mundo descrente e desesperançado para proclamar: Aleluia! A vida vence a morte! O caminho do Paraíso não está mais trancado! Nos passos do Redentor, chegamos ao horizonte definitivo, para o qual não necessitaremos mais de caminho, pois Ele - o caminho, a verdade e a vida -  será nossa plenitude e totalidade de salvação.


4.    REZAR A PALAVRA: Tendo meditado, ponha-se em diálogo amoroso com Deus, fazendo eco do texto lido e compreendido, passando das ideias ao sentimento de intimidade com o Deus da vida. Repita alguma palavra que mais lhe tocou e transforme em oração de agradecimento (ou louvor, súplica, pedido de perdão, etc),  fala ndo espontânea e amorosamente com Deus.

 

5.    COMPROMETER-SE COM A ORAÇÃO: decida-se por um gesto bem concreto a ser realizado como consequência da oração, pondo em prática o que a Palavra lhe sugere.

 

quarta-feira, 13 de junho de 2012

SÍNDROME DO ESTRELISMO


Autor não informado
Muitas pessoas são acometidas na vida por uma doença muito grave chamada “Síndrome do Estrelismo”. Duas grandes ilusões acompanham os portadores desta síndrome. Primeiramente, pensam que têm brilho próprio. Em segundo lugar, pensam que o seu brilho dura para sempre.

Toda estrela vive a ilusão do brilho próprio e pensa que brilha por si mesma; logo imagina também que se basta a si mesma. É o complexo de superioridade, sempre acompanhado de alguns sintomas muito conhecidos, tais como presunção, arrogância, soberba, orgulho e vaidade. Geralmente esse tipo de luz se apaga muito rapidamente e, pior ainda, quando cair, a queda é muito grande.

Neste mundo de DEUS ninguém tem brilho próprio. As noites enluaradas nada mais são do que reflexo do brilho do sol sobre a lua. O sol brilha e a lua resplandece. Se na própria natureza percebemos o valor da interdependência, da justa cooperação para a beleza maior do universo, também isso é verdadeiro no plano da vivência humana.

Quando resplandecemos, alguém está nos emprestando o seu brilho. Quem pensa que brilha sozinho, vive uma grande ilusão e usurpa uma luz que não lhe pertence. Nossas vitórias e conquistas trazem o reflexo de muitos brilhos e do brilho de muitos, e que, mesmo no anonimato, ainda assim são mais importantes do que imaginamos.

Outra grande ilusão do portador da síndrome do estrelismo é imaginar que vai brilhar para sempre. É o complexo de eternidade adoecendo a vida de alguns pobres mortais. Nesta vida nada é para sempre!

Existem pessoas que não podem conquistar alguns espaços sociais, especialmente no exercício do poder e de influência (políticos, religiosos, artistas, intelectuais etc.), pois se imaginam astros-reis, brilhando numa constelação de míseros vaga-lumes.

Tais pessoas esquecem que a vida terrena é muito efêmera, e que as marcas desta efemeridade estão presentes em toda nossa existência. Tudo na vida é ilusório. O rei Salomão disse: “Tudo é vaidade!” Isso vale, também, para os que se imaginam intocáveis e eternos.

Neste novo milênio, seremos todos desafiados a buscar a cooperação mútua, o intercâmbio constante e o reconhecimento de que não somos estrelas isoladas, mas membros de uma grande constelação, onde o brilho de todos é também reflexo do brilho de cada um.

Precisamos deixar que os outros brilhem, pois muitas vezes, quando alguém lança uma luz sobre nosso caminho, aponta-nos o abismo onde iríamos cair.

Estrela não tem luz própria. A glória do universo é apenas um pequeno reflexo da luz maior que provém de DEUS e todos nós somos fagulhas de DEUS.

Quando pensamos que estamos brilhando, é ELE quem nos empresta a Sua luz.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

ANÁLISE (SOCRÁTICA) DOS TEMPOS ATUAIS



FREI BETO

Encontrei Daniela, 10 anos, no elevador, às nove da manhã, e perguntei: 'Não foi à aula?' Ela respondeu: 'Não. Minha aula é pela tarde'. Comemorei: 'Que bom então de manhã você pode brincar dormir até mais tarde'. 'Não', retrucou ela, 'tenho tanta coisa de manhã'. 'Que tanta coisa?', perguntei. 'Aulas de inglês, de balé, de pintura, piscina', e começou a elencar seu programa de garota robotizada.

Fiquei pensando: 'Que pena, a Daniela não disse: 'Tenho aula de meditação!'

Estamos construindo super-homens e super-mulheres, totalmente equipados, mas emocionalmente infantilizados.

Uma progressista cidade do interior de São Paulo tinha, em 1960, seis livrarias e uma academia de ginástica; hoje, tem sessenta academias de ginástica e três livrarias! Não tenho nada contra malhar o corpo, mas me preocupo com a desproporção em relação à malhação do espírito.

Acho ótimo, vamos todos morrer esbeltos: 'Como estava o defunto?'. 'Olha uma maravilha, não tinha uma celulite!' Mas como fica a questão da subjetividade? Da espiritualidade? Da ociosidade amorosa?

A palavra hoje é 'entretenimento'; domingo, então, é o dia nacional da imbecilização coletiva. Imbecil o apresentador, imbecil quem vai lá e se apresenta no palco, imbecil quem perde a tarde diante da tela.

Como a publicidade não consegue vender felicidade, passa a ilusão de que felicidade é o resultado da soma de prazeres: 'Se tomar este refrigerante, vestir este tênis, usar esta camisa, comprar este carro, você chega lá!' O problema é que, em geral, não se chega! Quem cede desenvolve de tal maneira o desejo, que acaba precisando de um analista. Ou de remédios. Quem resiste, aumenta a neurose.

O grande desafio é começar a ver o quanto é bom ser livre de todo esse condicionamento globalizante, neoliberal, consumista. Assim, pode-se viver melhor. Aliás, para uma boa saúde mental três requisitos são indispensáveis: amizades, auto-estima, ausência de estresse.

Há uma lógica religiosa no consumismo pós-moderno. Na Idade Média, as cidades adquiriam status construindo uma catedral; hoje, no Brasil, constrói-se um shopping Center. É curioso: a maioria dos shoppings centers tem linhas arquitetônicas de catedrais estilizadas; neles não se pode ir de qualquer maneira, é preciso vestir roupa de missa de domingo. E ali dentro sente-se uma sensação paradisíaca: não há mendigos, crianças de rua, sujeira pelas calçadas...

Entra-se naqueles claustros ao som do gregoriano pós-moderno, aquela musiquinha de esperar dentista. Observam-se os vários nichos, todas aquelas capelas com os veneráveis objetos de consumo, acolitados por belas sacerdotisas.

Quem pode comprar à vista, sente-se no reino dos céus. Se deve passar cheque pré-datado, pagar a crédito, entrar no cheque especial, sente-se no purgatório. Mas se não pode comprar, certamente vai se sentir no inferno... Felizmente, terminam todos na eucaristia pós-moderna, irmanados na mesma mesa, com o mesmo suco e o mesmo hambúrguer do Mc Donald...

Costumo advertir os balconistas que me cercam à porta das lojas: 'Estou apenas fazendo um passeio socrático.' Diante de seus olhares espantados, explico: 'Sócrates, filósofo grego, também gostava de descansar a cabeça percorrendo o centro comercial de Atenas. Quando vendedores como vocês o assediavam, ele respondia:

- "Estou apenas observando quanta coisa existe de que não preciso para ser feliz!"




sábado, 25 de fevereiro de 2012

ME CHAMEM DE VELHA

                                                                                 Eliane Brum (Revista Época)

A velhice sofreu uma cirurgia plástica na linguagem
Na semana passada, sugeri a uma pessoa próxima que trocasse a palavra
“idosas” por “velhas” em um texto. E fui informada de que era
impossível, porque as pessoas sobre as quais ela escrevia se recusavam
a ser chamadas de “velhas”: só aceitavam ser “idosas”. Pensei:
“roubaram a velhice”. As palavras escolhidas – e mais ainda as que
escapam – dizem muito, como Freud já nos alertou há mais de um século.
Se testemunhamos uma epidemia de cirurgias plásticas na tentativa da
juventude para sempre (até a morte), é óbvio esperar que a língua seja
atingida pela mesma ânsia. Acho que “idoso” é uma palavra
“fotoshopada” – ou talvez um lifting completo na palavra “velho”. E
saio aqui em defesa do “velho” – a palavra e o ser/estar de um tempo
que, se tivermos sorte, chegará para todos.

Desde que a juventude virou não mais uma fase da vida, mas uma vida
inteira, temos convivido com essas tentativas de tungar a velhice
também no idioma. Vale tudo. Asilo virou casa de repouso, como se isso
mudasse o significado do que é estar apartado do mundo. Velhice virou
terceira idade e, a pior de todas, “melhor idade”. Tenho anunciado a
amigos e familiares que, se alguém me disser, em um futuro não tão
distante, que estou na “melhor idade”, vou romper meu pacto pessoal de
não violência. O mesmo vale para o primeiro que ousar falar comigo no
diminutivo, como se eu tivesse voltado a ser criança. Insuportável.

A velhice é o que é. É o que é para cada um, mas é o que é para todos,
também. Ser velho é estar perto da morte. E essa é uma experiência
dura, duríssima até, mas também profunda. Negá-la é não só inútil como
uma escolha que nos rouba alguma coisa de vital. Semanas atrás, em um
programa de TV, o entrevistador me perguntou sobre a morte. E eu disse
que queria viver a minha morte. Ele talvez não tenha entendido, porque
afirmou: “Você não quer morrer”. E eu insisti na resposta: “Eu quero
viver a minha morte”.

Na adolescência, eu acalentava a sincera esperança de que algum
vampiro achasse o meu pescoço interessante o suficiente para me
garantir a imortalidade. Mas acabei aceitando que vampiros não
existem, embora circulem muitos chupadores de sangue por aí. Isso só
para dizer que é claro que, se pudesse escolher, eu não morreria. Mas
essa é uma obviedade que não nos leva a lugar algum. Que ninguém quer
morrer, todo mundo sabe. Mas negar o inevitável serve apenas para
engordar o nosso medo sem que aprendamos nada que valha a pena.

A morte tem sido roubada de nós. E tenho tomado providências para que
a minha não seja apartada de mim. A vida é incontrolável e posso
morrer de repente. Mas há uma chance razoável de que eu morra numa
cama e, nesse caso, tudo o que eu espero da medicina é que amenize a
minha dor. Cada um sabe do tamanho de sua tragédia, então esse é
apenas o meu querer, sem a pretensão de que a minha escolha seja
melhor que a dos outros. Mas eu gostaria de estar consciente, sem dor
e sem tubos, porque o morrer será minha última experiência vivida.
Acharia frustrante perder esse derradeiro conhecimento sobre a
existência humana. Minha última chance de ser curiosa.

Há uma bela expressão que precisamos resgatar, cujo autor não consegui
localizar: “A morte não é o contrário da vida. A morte é o contrário
do nascimento. A vida não tem contrários”. A vida, portanto, inclui a
morte. Por que falo da morte aqui nesse texto? Porque a mesma lógica
que nos roubou a morte sequestrou a velhice. A velhice nos lembra da
proximidade do fim, portanto acharam por bem eliminá-la. Numa
sociedade em que a juventude é não uma fase da vida, mas um valor,
envelhecer é perder valor. Os eufemismos são a expressão dessa
desvalorização na linguagem.

Não, eu não sou velho. Sou idoso. Não, eu não moro num asilo. Mas numa
casa de repouso. Não, eu não estou na velhice. Faço parte da melhor
idade. Tenho muito medo dos eufemismos, porque eles soam bem
intencionados. São os bonitinhos mas ordinários da língua. O que fazem
é arrancar o conteúdo das letras que expressam a nossa vida. Justo
quando as pessoas têm mais experiências e mais o que dizer, a
sociedade tenta confiná-las e esvaziá-las também no idioma.

Chamar de idoso aquele que viveu mais é arrancar seus dentes na
linguagem. Velho é uma palavra com caninos afiados – idoso é uma
palavra banguela. Velho é letra forte. Idoso é fisicamente débil,
palavra que diz de um corpo, não de um espírito. Idoso fala de uma
condição efêmera, velho reivindica memória acumulada. Idoso pode ser
apenas “ido”, aquele que já foi. Velho é – e está. Alguém vê um Boris
Schnaiderman, uma Fernanda Montenegro e até um Fernando Henrique
Cardoso como idosos? Ou um Clint Eastwood? Não. Eles são velhos.

Idoso e palavras afins representam a domesticação da velhice pela
língua, a domesticação que já se dá no lugar destinado a eles numa
sociedade em que, como disse alguém, “nasce-se adolescente e morre-se
adolescente”, mesmo que com 90 anos. Idosos são incômodos porque usam
fraldas ou precisam de ajuda para andar. Velhos incomodam com suas
ideias, mesmo que usem fraldas e precisem de ajuda para andar.
Acredita-se que idosos necessitam de recreacionistas. Acredito que
velhos desejam as recreacionistas. Idosos morrem de desistência,
velhos morrem porque não desistiram de viver.

Basta evocar a literatura para perceber a diferença. Alguém leria um
livro chamado “O idoso e o mar”? Não. Como idoso o pescador não
lutaria com aquele peixe. Imagine então essa obra-prima de Guimarães
Rosa, do conto “Fita Verde no Cabelo”, submetida ao termo “idoso”:
“Havia uma aldeia em algum lugar, nem maior nem menor, com velhos e
velhas que velhavam...”.

Velho é uma conquista. Idoso é uma rendição.

Como em 2012 passei a estar mais perto dos 50 do que dos 40, já começo
a ouvir sobre mim mesma um outro tipo de bobagem. O tal do “espírito
jovem”. Envelhecer não é fácil. Longe disso. Ainda estou me
acostumando a ser chamada de senhora sem olhar para os lados para
descobrir com quem estão falando. Mas se existe algo bom em
envelhecer, como já disse em uma coluna anterior, é o “espírito
velho”. Esse é grande.

Vem com toda a trajetória e é cumulativo. Sei muito mais do que sabia
antes, o que significa que sei muito menos do que achava que sabia aos
20 e aos 30. Sou consciente de que tudo – fama ou fracasso – é
efêmero. Me apavoro bem menos. Não embarco em qualquer papinho mole.
Me estatelei de cara no chão um número de vezes suficiente para saber
que acabo me levantando. Tento conviver bem com as minhas marcas.
Conheço cada vez mais os meus limites e tenho me batido para
aceitá-los. Continua doendo bastante, mas consigo lidar melhor com as
minhas perdas. Troco com mais frequência o drama pelo humor nos
comezinhos do cotidiano. Mantenho as memórias que me importam e jogo
os entulhos fora. Torço para que as pessoas que amo envelheçam porque
elas ficam menos vaidosas e mais divertidas. E espero que tenha tempo
para envelhecer muito mais o meu espírito, porque ainda sofro à toa e
tenho umas cracas grudadas à minha alma das quais preciso me livrar
porque não me pertencem. Espero chegar aos 80 mais interessante,
intensa e engraçada do que sou hoje.

Envelhecer o espírito é engrandecê-lo. Alargá-lo com experiências.
Apalpar o tamanho cada vez maior do que não sabemos. Só somos sábios
na juventude. Como disse Oscar Wilde, “não sou jovem o suficiente para
saber tudo”. Na velhice havemos de ser ignorantes, fascinados pelas
dimensões cada vez mais superlativas do que desconhecemos e queremos
buscar. É essa a conquista. Espírito jovem? Nem tentem.

Acho que devíamos nos rebelar. E não permitir que nos roubem nem a
velhice nem a morte, não deixar que nos reduzam a palavras bobas, à
cosmética da linguagem. Nem consentir que calem o que temos a dizer e
a viver nessa fase da vida que, se não chegou, ainda chegará. Pode
parecer uma besteira, mas eu cometo minha pequena subversão jamais
escrevendo a palavra “idoso”, “terceira idade” e afins. Exceto, claro,
se for para arrancar seus laços de fita e revelar sua indigência.

Quando chegar a minha hora, por favor, me chamem de velha. Me sentirei
honrada com o reconhecimento da minha força. Sei que estou
envelhecendo, testemunho essa passagem no meu corpo e, para o futuro,
espero contar com um espírito cada vez mais velho para ter a coragem
de encerrar minha travessia com a graça de um espanto.